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OS SENTIDOS DA PAIXÃO

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Medo da multidão e dos espaços vazios. Medo dos encontros e desencontros. Medo da janela aberta e da porta fechada. Medo do escuro e da luz na tela da TV. Medo dos ruídos e da harmonia dos ensaios de orquestras. Medo da liquidação e dos preços altos. Medo do frio e da água fervendo no fogão. Medo das expectativas e da falta de esperança. Medo da euforia e da derradeira melancolia. Medo do esquecimento e das lembranças. Medo do assalto e das câmeras de segurança. Medo das alturas e do fundo do poço. Medo da violência e dos slogans de solidariedade. Medo do tédio e da quebra de rotina. Medo do próximo e de mim. Medo das forças ocultas e da objetividade. Medo da parede pintada e das cinzas dentro do cinzeiro. Medo das superstições e do bom senso. Medo da morte e da ressurreição. Medo da dor e da surpresa alegre no fim do dia. Medo do mal e dos planos de saúde. Medo da tecnologia e das cidades de interior. Medo do mar e dos desertos de areia. Medo de se atrasar e de furar a fila. Medo do e...

CONTANDO AS HORAS

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"Neste grande imenso pet shop/A cultura é um sabão/Artigo de fim de estoque/Aproveite a ocasião/Mundo mundo mundo cão/Mundo mundo cão" (Zeca Baleiro/Sérgio Natureza) Enquanto a semana passa, uma tosse incrível me pegou de jeito. E contrariando o bom senso que ronda nossa vida feito uma sombra grudenta, fumo mais um cigarro para distrair minhas emoções. Tenho bebido bastante, calibrando meu tato e escorregando no chão do banheiro, passo em frente às vitrines, zanzando feito uma barata tonta e acho que estou sob suspeita. O vigia vem na direção contrária e eu desvio o olhar para uma blusa muito bonita, numa loja muito bonita, com vendedoras muito bonitas e fico ouvindo funk dos anos 60 pelo MP3. Em casa fico brincando de instalar e desinstalar programas e espero pacientemente que o mouse destrave e saia do canto da tela. Somos tão tolerantes com a tecnologia e ficamos de boca aberta, banbando feitos cachorros doidos, com as propagandas na TV. Mas fico parada, desanimada, sem en...

O MENINO QUE DORMIA

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Ele entrava na escola no colo da avó, e dormia profundamente. Era tão cedinho ainda... Enquanto a professora cantava em roda com os seus amiguinhos, a música de boas-vindas, ele dormia, profundamente. As primeiras horas do dia eram feitas de sonhos, e por isso, talvez, o menino não queria acordar. Enquanto o mundo acordado fazia um monte de coisas, o menino ficava de olhos bem fechados, e o colorido da classe não atingia sua íris. Só quando davam nove horas... o dia começava para o menino... ele agora continuava sonhando, acordado... (Célia Demézio)

O MEDO DA MENINA

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Ela tinha medo, de muitas coisas. Como por exemplo, de pombo, de dinossauro, de balance, do escuro. Chorava muito quando tinha medo. Ficava assustada com brincadeiras de monstro. Arregalava o olho e abria o berreiro. Chorava tanto que ela salgava toda a boca, parecendo que estava tomando sopa de lágrimas. Um dia sua mãe disse que tudo que ela tinha medo não fazia mal nenhum a ninguém. Ela podia ficar tranqüila, porque nada aconteceria no escuro, e que os pombos não mordiam ninguém. A voz de sua mãe era tão suave que a menina adormeceu em seu colo e sonhou que estava brincando com pombos, assistia desenhos de dinossauro e que o escuro tinha cheiro de chocolate. A partir daí, a menina não teve mais medo, e viveu feliz com tudo que existia no mundo... (Célia Demézio)

O ATRASO

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O canto da televisão avisava a hora marcada. Cobria um pedaço do terno do entrevistado. Tentei marcar as horas no relógio digital. Mas não conseguia alcançar a hora exata. Por milésimos de segundos estava atrasada. Fiquei com o dedo nos botões, prontos para acertar o tempo. Um toque no botão das horas, dois toques nos botões dos minutos. Por questão de distração fiquei dois minutos atrás. Quando tentei acertar, adiantei-me para o dia seguinte... De qualquer forma, é uma forma de atraso... Passei por alguns segundos, da quinta para sexta-feira... Logo tratei de voltar os ponteiros para trás. Tentei alcançar o horário marcado no canto esquerdo da TV. Mas nunca consigo ser pontual com o que vejo... Por milésimos de segundos muita coisa já passou bem na frente do seu nariz... É cruel essa corrida contra o tempo... A entrevista acaba: "Obrigado, mas nosso tempo esgotou"... Depois de uma hora, vieram os créditos finais... (Célia Demézio)

MISSÃO COMPRIDA

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Você conseguiu tudo na vida: uma grande barriga bem alimentada, uma amante infiel uma esposa comportada carro do ano filhos rebeldes ao teu jugo tirano casa própria, emprego com crachá um sítio em Visconde de Mauá um ufanista amor pelo país tudo como manda o figurino(de Paris). E morrerá, cumprindo a sua parte, de tensão ou de enfarte, de repente, sem nem ao menos de longe perceber que podia ter sido diferente. (Leila Míccolis) http://www.blocosonline.com.br/home/index.php

Las cortinas y Mi monstro

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Me dan miedo las cortinas, en realidad no son las cortinas sino lo que hay detrás de ellas, aquello que no vemos pero imaginamos. Siento un temor especial cuando para emprolijar la casa cierro la cortina de la ducha, la única que existe en casa, escondiendo baldes, secadores de piso, trapos, lavandinas, detergentes y otras cositas. No puedo evitar pensar que hay alguien escondido allí. Y así fue que temiendo sin sentido sucedió lo que mi temor deseaba. Fue unas de aquellas defecadas irrepetibles, esas que complementan un par de días sin nada, el almuerzo del domingo, y las porquerías que comí el sábado porque salí de joda y me chupé todo y después me comí todo para rebajar mi soberano pedo etílico. El caso es que al correr la cortina me lo encontré, era un monstruo literal y se parecía a mí, pensé por un segundo que estaba llegando al final de mis días. No fue así, después de extensas conversaciones y sin otra que asumir mi exposición escatógica llegamos a un acuerdo, de a poco nos hic...